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A vigília dos vultos

  • Foto do escritor: Marcelo Madeira
    Marcelo Madeira
  • 22 de fev. de 2017
  • 2 min de leitura

espíritos

Volta e meia, eu me encontro num lugar estranho e penetrante. Sinto-me dentro de uma atmosfera, onde tudo é tão lento, tão silencioso, que até o próprio tempo parece se estancar. E paira, nessa atmosfera morosa, uma luminosidade fraca, relaxante, oscilando entre um tom azulado e púrpuro que se estende por um vasto deserto de rochas e pedregulhos.


Quando me ponho a imaginar esse mundo, ouço uma leve, mas pertinente vibração que parece provir do ranger das rochas e que suavemente faz com que uma serenidade plena flutue no ar. A fina vibração persiste quando fecho os olhos. Posso até sentir calafrios em minha pele.


Toda vez que eu era surpreendido, com tais imagens e sensações, pensava estar sozinho, completamente isolado. Não tinha sequer pretensões de saber mais sobre aquele mundo do qual eu já estava bem à vontade. Até que numa dessas aparições pude ver surgir, vindas do interior de grutas e do solo, criaturas esguias, encapuzadas com longas vestes brancas. Eram muitos, vinham de toda a parte. Esbeltos, caminhavam vagarosos, num ritmo suave e moroso. Pareciam na verdade flutuar. Eles se agrupavam, de três em três, em faces opostas, agachavam-se e, pouco a pouco, suas mãos procuravam o solo. Seus longos dedos raspavam o cascalho e dele extraíam sais minerais que lentamente levavam a boca e mastigavam.


À medida que se alimentavam, uma luminosidade roxa, sobre suas silhuetas, intensificava-se ainda mais, piscava agoniada, tornando-a mais fria e penetrante. Logo, o ambiente foi tomado por um lençol de gases, que nos manteve suspensos no ar. Eu, mergulhado num silêncio lasso, sentia formigas passearem em meus braços.


Uma madrugada manhosa nascia e me lançava à inércia da vida. Frouxo, cambaleante. O ranger das pedras, que o deserto oprime e sufoca, oscilava cá fora; a tremenda morte que me olha com parda ardência, rumina. Seu ruminar é a própria vida.


Em meio a tal cenário, eu, queimado de volúpia, era o pó, a poeira e a pedra. Eu era meu próprio deserto a estirar-se léguas por terra.



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 O Autor 

 

 

Sagitariano, publicitário, escritor músico, alfabetizador, assistente social e Mestre Reiki . 

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