Um Conto de Natal
- Marcelo Candido Madeira
- 24 de dez. de 2015
- 3 min de leitura

Todo ano é a mesma coisa, chega a essa altura do ano e não há quem dê conta. O trabalho se multiplica, são tantas crianças e tantas casas para visitar, e fora os marmanjos que ainda insistem em serem presenteados! Tenha dó! Eu já sou um velhinho e depois de tantos anos de serviço não tenho direito a aposentadoria, sempre que vou reclamar meus direitos à Previdência Social eles me dizem a mesma coisa:
– O meu senhor que estória é essa? O senhor só pode estar brincando! Volta pra casa, senão eu lhe mando pra um asilo de loucos! E libere a fila, por favor! Próximo!!!
Cada ano que passa fica mais difícil, chaminé já não existe mais e quando tem são estreitas para meu físico avantajado. E já foi o tempo em que eu ficava pulando de telhado em telhado, haja preparo físico! Até meus ajudantes já não são mais os mesmos, perdi um bocado deles com a globalização, muitos me trocaram por ofertas gratificantes de multinacionais de brinquedos e aqueles que ficaram comigo vivem fazendo greves e se queixando aos sindicatos. Haja saúde, aliás saúde é o que não me falta, pois para percorrer tantos quilômetros em trenó, enfiado numa roupa quente sob o calorão de dezembro… Tenha santa paciência. E no final das contas, não sou reconhecido.
Esta noite não será diferente, já visitei algumas casas, já deixei presentes ao pé das árvores natalinas e doces dentro das meias penduradas na lareira. Quem não tem lareira sempre prega a meia, às vezes bordada à mão, na parede ou perto das janelas. Às vezes é complicado de encontrá-las. É difícil também quando a casa tem cachorro, mas para isso meus ajudantes sempre providenciam um bom pedaço de carne para ele não fazer alarme. E essa onda de assalto está um horror e nem poupam o pobre velhinho. Já tive problemas uma vez, mas por sorte fui reconhecido e ele acabou me entregando uma cartinha de seu filho. No fundo ele era um bom homem, coitado.
Agora vou me preparar para visitar mais uma casa, primeiro fazemos um check-up, sem chaminé, sem cachorro, tudo ok? Onde é a janela? Alarme contra assalto? Tudo ok. Entrei sem ruídos, sou mestre nisso, porém, de repente, acende-se a luz da sala.
– Quem é você? Identifique-se! Pai! Pega ladrão!!!
– Psiu, quieto rapaz, sou eu, não me reconhece?
– Não.
– Como não? Trouxe um presente pra você. Olha só.
E lhe entreguei com maior carinho um caminhãozinho de madeira colorida. E ele rudemente o pôs no chão e depois de um tempo observando o brinquedo me perguntou:
– Não se mexe, não tem pilha?
– Não gostou?
– Pai! Pega ladrão!!! Tum, tum, tum! – E me dava umas almofadadas o moleque.
– Se você não gostou, não tem importância. Eis aqui o meu cartão, você me escreve e eu lhe mando o que você pedir, tá bom?
– Pai! Pega ladrão!!! Tum, tum, tum!
E com tanta barulheira a mãe do menino entra na sala, eu sem hesitar pulei a janela e desapareci. A mãe lhe dizia docemente:
– Meu filho, vamos dormir que amanhã abriremos os presentes.
O menino vendo pela janela meu trenó alcançando as estrelas pensou:
– Mas, ele é mágico? Ele voa? Ah! Como não pensei nisto antes? Ele é o velho Dumbledore da Escola de Magos do Harry Potter!
Comments